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domingo, 20 de outubro de 2013

Espaço do acadêmico - Jeane Carla Izaías Germínio

Análise da relação entre o artigo 126 e 26 do Código Penal






Art. 126 - Provocar aborto com o consentimento da gestante:

Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.
Parágrafo único - Aplica-se a pena do artigo anterior, se a gestante não é maior de 14 (quatorze) anos, ou é alienada ou débil mental, ou se o consentimento é obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência.

Art. 26 - É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Redução de pena

Parágrafo único - A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.”

            Antes de iniciar a relação entres o crime de aborto consentido (art.126 CP) e o artigo 26 CP, é oportuno esclarecer algumas problemáticas nos artigos referentes ao crime de aborto.

            O tipo penal referente ao art.124 é um crime de ação múltipla (crime de conteúdo variado) e engloba duas condutas: a primeira, a gestante provoca o abortamento (autoaborto); e a segunda, a gestante consente que o terceiro lhe provoque. Em um caso concreto, se a gestante realizar uma das condutas ou as duas, simultaneamente, incorre na pena cominada do artigo supracitado. Em uma segunda situação, se um terceiro provocar aborto com o consentimento da gestante, este incorrerá na conduta do art. 126 e a gestante responderá pelo pena referida ao art. 124. Esta ultima suposição é uma das exceções à teoria monística da ação, adotada em nosso Código Penal. Referida teoria defende que todos os que concorrerem para o resultado criminoso devem responder pelo mesmo crime. Na situação em análise o resultado é um só, ou seja, a morte do feto. Segundo a lógica da teoria monista, todos os envolvidos deveriam responder pelo mesmo crime, mas o legislador do diploma de 1940 entendeu que as condutas têm reprovabilidade distintas e, por isso, resolveu criar a esta exceção, de tal modo que a gestante incorra em crime mais brando (art. 124, 2ª parte), por ter consentido no aborto, enquanto o terceiro, que realizou os procedimentos abortivos, pratica crime mais severamente punido (art. 126). Podemos sintetizar referido entendimento com a citação do doutrinador Bitencourt (2013, p.168) “Concluindo, a mulher que consente no aborto incidirá nas mesmas do autoaborto, isto é, como se tivesse provocado o aborto em sim mesma, nos termos do art. 124 do CP. A mulher que consente no próprio aborto e, na sequência, auxilia decisivamente nas manobras abortivas pratica um só crime, pois provocar aborto em si mesma, ou consentir que outrem lho provoque é crime de ação múltipla ou de conteúdo variado...” [...] “O aborto consentido não admite coautoria entre o terceiro e a gestante...”.

            Para que ocorra o crime tipificado no art. 126, se faz necessário o consentimento da gestante e que este perdure até a consumação do ato. Caso a mulher grávida que, inicialmente, havia prestado consentimento se arrependa (durante a realização das manobras abortivas) e peça ao agente que não o faça, mas este prossiga na execução do crime e pratique o aborto, responderá, por crime de aborto sem o consentimento da gestante (art.125, conduta com pena mais severa), enquanto que a conduta da gestante - de ter retirado o consentimento ao aborto e mesmo assim foi forçada a fazer - é atípica.

            Além do consentimento válido da gestante (obtido de forma livre e espontânea) para que se execute a manobra abortiva por terceiro (conduta que o terceiro se enquadraria no art 126), existe o consentimento negativo da gestante (casos enquadrados no art.125 e no parágrafo único do 126 CP). Este pode ser subdividido em dois tipos: a) quando não houver qualquer autorização por parte da gestante, o que se dá, por exemplo, quando o agente agride uma mulher grávida objetivando o aborto, ou quando introduz clandestinamente substancias abortivas na bebida dela; b) quando houver uma autorização da gestante, mas tal anuência carece de valor jurídico em razão do que dispões o texto legal. É o que se dá nas cinco hipóteses elencadas no artigo 126 CP (consentimento obtido através de fraude, grave ameaça, violência, quando a gestante não é maior de 14 anos e quando é alienada ou débil mental, de modo que não possa entender a significado de seu gesto).

            A relação entre o art 26 e o art. 126 CP está presente na redação da primeira parte do parágrafo único deste artigo. Hipótese em que a ausência de consentimento é presumida, sendo assim a conduta é enquadrada no art. 125 CP com pena mínima de três anos e máxima de 10 anos. O legislador do Código Penal Brasileiro valorou, por razão lógica, como mais deplorável o aborto realizado em gestante não maior de 14 anos, alienada ou débil mental, mesmo que esta tenha consentido com aborto, tal consentimento é irrelevante e não serviria para enquadrar a conduta do terceiro, que realiza a manobra abortiva, na pena relacionada ao caput do art. 126 que é sem dúvida mais benéfica que a relacionada ao parágrafo único do art 126 que remete a pena do art. 125. Se fosse um caso de gestante que consentisse com aborto e não estiver elencada neste rol, o consentimento (se este não fosse obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência) seria elementar do tipo no artigo 126, sendo assim, mais benéfico para o terceiro que realiza a manobra abortiva. Por fim, ao analisarmos o art. 26 relacionado ao art. 126, observamos que a gestante que esteja enquadrada no rol supracitado pode ser isentada da pena (se possuir doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado e era ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento) ou ter sua pena reduzida de um a dois terços (se era relativamente incapaz de entender seus atos na época do fato). É importante destacar que, pela corrente defendida por Bitencourt, a pena que a gestante poderia incorrer seria a cominada no artigo 124 do Código Penal.


Bibliografia:

GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal Parte Especial. Rio de Janeiro: Impetus, 2012
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. Volume 2. 5a ed. São Paulo: Saraiva, 2013.
                                                                                                   
GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Penal: Parte Especial. São Paulo: Saraiva, 2011.


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