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domingo, 23 de fevereiro de 2014

Espaço do acadêmico - Mariana Teles

A mídia e o Direito: 

Um novo tribunal supremo ou ‘’Adote um Bandido’’


                                       


     A ausência de eficiência pública nos serviços de segurança do estado nunca foi tão mal preenchida com a presença (sensacionalista) da mídia como hoje. O direito à informação, assim como a liberdade de expressão são invariáveis axiológicos e garantias constitucionais invioláveis, que devem, portanto gozar de respeito e primazia do nosso ordenamento jurídico. Entretanto, quando se cumulam com o desejo desenfreado de conquistar a unanimidade do senso comum promovem apenas uma vingança privada com efeitos de pública e realizada pela autotutela de uma sociedade que cria e depois busca combater o crime.


O Direito Penal desde o ‘’episódio’’ do julgamento da ação penal 470 (difundida e chamada vulgarmente de ‘’mensalão’’) é alvo principal do debate midiático, seguido por capítulos de discussões acerca da maioridade penal, ganham paralelamente o foco além das câmeras, e atingem o inconsciente coletivo, promovendo uma novela televisionada onde todo mundo opina sobre o desfecho do último capítulo.


Discute-se nos últimos dias (mais precisamente), um novo embate, que para não fugir da regra durará até um novo tomar a tribuna da imprensa e ter a condenação divulgada com todos os holofotes necessários para os aplausos dos telespectadores, o que mais surpreende neste (necessariamente), é que dessa vez o alvo do ataque e a tribuna de condenação partem essencialmente de um mesmo campo, a própria mídia.


A opinião expressa da jornalista âncora do SBT Rachel Sheherazade no supra canal de televisão acerca do jovem preso ao poste, resultando com a ação de um grupo de combate alcunhado de ‘’Justiceiros’’, bem como os manifestos de indignação que sucederam a ação do grupo, desencadeando o surgimento das alternativas de defesa e protestos protagonizados pelos defensores dos Direitos Humanos, vem gerando polêmica dentro e fora da emissora. 


A jornalista já conhecida pelo sensacionalismo expresso em outras oportunidades finalizou a notícia com um linchamento verbal ao serviço de segurança pública e a sociedade quando lançou uma campanha, em que enquanto combatia agressivamente a conduta do jovem que foi preso e prestava apologia aos que lhe amarraram, sugeriu ainda, para que os incomodados com a aspereza das suas afirmações ‘’adotem um bandido’’[sic], e assim lançou-se a campanha já com expressão nacional.


Foi o bastante para que as mais diversas adoções surgissem, contras e prós do discurso da jornalista, invadiram as telas e manchetes para mais uma vez o Direito Penal emprestar a lente (e o foco) para o poder midiático, e a preocupação social começar a girar em torno da opinião da jornalista e em discrepância a isso, assistirmos ao jovem mesmo longe do poste que foi preso, continuar sufocado com as correntes da melanina, do salário e da residência (ou da falta desses últimos).


A falta de separação de competências, jurídicas e midiáticas transformam o exercício jurídico em um segundo poder e fazem do poder de imprensa uma força pro ativa em relação às demais, tratando questões que deveriam ser analisadas pela justiça (em sentindo jurídico) em opiniões de um senso que não contextualiza as atribuições e engole as informações antes da real digestão dos fatos, divulgando assim, a imagem de um poder mais inoperante do que de fato é e colocando em risco a segurança jurídica própria e necessária ao poder judiciário.


A opinião da jornalista apenas constata mais uma obviedade contemporânea, a desorganização e os limites minimizados das relações de poder, em que gera mais ibope uma opinião sobre um fato, do que o próprio fato em que a opinião se fundamenta, transferindo o julgamento do poder competente e constituído para tal, para uma atribuição de massa onde a vingança particular compromete a solução buscada pelo estado de direito.


É incontestável o poder de influencia exercido pela mídia e mais incontestável ainda a relevância social de determinados temas, uma vez que, sendo o Direito um objeto estritamente humano que nasce e que se destina pela e para sociedade seria arbitral e inaceitável dentro de um estado democrático a ausência da participação social dentro do universo jurídico.


No entanto o saber jurídico é objeto de uma ciência essencialmente normativa e que até mesmo a linguagem descritiva que a compõe é direcionada para o estudo acadêmico técnico e profissional da área, fazendo com que o senso esclarecido busque ofuscar a dedução simplificada do senso comum, e a técnica encontre a imparcialidade das decisões dentro de um exercício de jurisdição equitativo e que prime pela segurança jurídica e a legalidade, estruturas basilares do nosso modelo de estado. Tocante a isso as inúmeras discussões protagonizadas na novela midiática em que o protagonista não é o Direito Penal e suas razões de ser, promove-se um julgamento social e usam a nossa necessidade brasileira de criar heróis e monstros para tornarem-se referências maiores de um tribunal de cores, câmeras e telas bem distante da norma e sua interpretação pelos órgãos competentes e a nossa corte jurídica (que também não escapou da midiatização),  transferindo para a força popular o julgamento jurídico, onde qualquer um ‘’jornaleiro’’ veste a toga de juiz de direito e todo mundo encarna o espírito do promotor, não de justiça, mas de imprensa e o único ministério respeitado é o da comunicação.
  

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