“Com uma faca peixeira, durante a madrugada,
desfechou um golpe mortal no peito de uma jovem prostituta, que se encontrava
no sexto mês de gravidez.”
A causa de tal gesto, segundo a versão de Zaqueu
(36 anos, casado, pai de três filhos), teria sido a recusa ou a desistência da
vítima em ter, com ele, relações sexuais. Esta o teria chamado para dormir e/ou
beber em casa dela, saindo assim do baixo meretrício, cujos estabelecimentos,
dada a hora, já estavam cerrando suas portas por determinação da polícia.
Pessoas outras (amigos da vítima e sua própria
filha) acreditam que Zaqueu deve tê-la seguido, e para esta se livrar teria
batido na casa de um senhor conhecido, local este onde se deu o crime. Uma das
testemunhas afirmou ter ouvido quando a vítima, já estando dentro da casa do
tal senhor, teria dito a Zaqueu: “vá embora eu não lhe chamei”. Ao que ele
respondera: “você não disse que vinha dormir comigo aqui? Mulher comigo não
rebola. Eu sou ruim mesmo”. Ela contra-argumentou, mostrando que ali seria
impossível, por ser casa dos outros, quando ele então a matou com um gesto tão
rápido e sem que houvesse briga, que o dono da casa pensou até que ele havia
apenas espancado.
Na versão de Zaqueu as palavras de desistência ou
recusa da vítima foram acompanhadas de um sorriso e um gesto (tapa no peito), a
ele dirigidos, o que o irritou, porque foram interpretados como provocação,
sobretudo por estar na presença de um homem, conhecido dos dois. A pancada que
recebeu teria sido, assim, o desencadeante da sua reação de matá-la, visto que
nunca teria apanhado de outra mulher que não de sua mãe.
O homicídio foi antecedido por programas nos bares
e gafieiras do pequeno lugarejo do interior onde os dois residiam, sem que,
contudo, tivessem estado juntos por maior tempo, antes do encontro que culminou
com o crime. Segundo depoimentos da mãe de Zaqueu, antes de sair de casa na
noite do crime, ele trocou de roupa, amolou a faca-peixeira, sua arma
preferida, apesar de possuir um revólver, e saiu sem dar ouvidos ao seu apelo
de que levasse os filhos para passear na rua – “ele não me ouviu e aí aconteceu
o que aconteceu”.
Ao ser julgado Zaqueu foi condenado a uma pena de
dezoito anos.”
ZAQUEU – informações complementares.
“Na época do crime estava desempregado; na cadeia,
trabalha na horta, vivendo atualmente (na época) em regime aldeado (fora da
cela). Casado com uma prima, sobrinha do pai, e pela qual foi deixado antes do
crime. O casal estava vivendo em grande crise, onde, por vezes, Zaqueu pensou
em matar a esposa, porque ela o traiu com outro homem. Quando dizia à sua mãe
desse seu desejo, esta pedia para que não o fizesse. Quando estava a sós com a
esposa, e que o desejo de matá-la vinha forte, percebia como se a mãe se
interpusesse entre os dois, para evitar.
Disse Zaqueu a mãe lamentar essa sua interferência,
uma vez que soube que se ele tivesse matado a esposa que o traiu, a pena teria
sido bem menor. Esta fala da figura materna parece refletir a sua expectativa
de que ao filho caberia matar uma mulher. (...) A mãe, quando grávida de Zaqueu
chegou a tomar alguma coisa para abortar. A sogra lhe sugerira abortar e largar
o marido que, a esta altura, estava muito doente. Ela não o largou para não
deixar de ‘ter a honra de ser uma mulher casada’.”
Texto extraído de: GUERRA, Alba Gomes. O crime -
realidade e desafio. 1990. p.120.
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