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domingo, 11 de fevereiro de 2018

Cristianismo

O cristianismo procura novas respostas.  O Antigo Testamento conduz o homem a uma série de indagações ao tratar no Gênesis do primeiro homicídio.  Antes do assassinato de Abel o Senhor Iahweh vendo Caim irritado com seu irmão e com o rosto transtornado, sob motivação do ciúme, adverte:  “ Se procederes mal o pecado deitar-se-á  à tua porta e andará a espreitar-te.  Cuidado, pois ele tem muita inclinação para ti, mas deves dominá-lo”. 

O texto deixa claro o entendimento de que o homem possui a liberdade de escolha entre a prática, ou não, do mal.  Portanto não existe a predestinação para o crime e, em virtude  da não intromissão divina no seu comportamento, Caim permanece livre na opção, ainda que haja muita inclinação, e que isso signifique tendências para determinados procedimentos.

Morto Abel o Senhor não o fulmina Caim de imediato em ato de justa cólera. Iahweh espera. Malgrado possuir pleno conhecimento das limitações de Caim assim como das suas motivações e procedimento, sabendo do homicídio praticado contra um irmão com violação da confiança que a vítima tinha em seu algoz, e provavelmente - conforme se depreende do relato bíblico - mediante dissimulação teria tornando impossível a defesa. O diálogo não é interrompido apesar da tentativa frustrada de encobrir ou negar a prática do crime. Caim descaradamente declara “não saber dele”, e acrescenta “são ser responsável pela guarda (segurança) do irmão. Depois do questionamento e da resposta que implicava em uma negativa de autoria Deus simplesmente indaga: “Que fizeste?” “Que fizeste?”.

Por ser um chamado à consciência é uma questão a qual nem o autor de qualquer crime ou o seu julgador pode escapar. Como em um inquérito são abordadas várias questões trazendo a tona investigações mediante as quais o cristianismo amplia as responsabilidades, não só quanto a um ato e seu autor, mas a todos os procedimentos que culminem com a eliminação da vida ou ataques a sua existência e atinge também os que se omitem ou decidem quanto à sorte dos criminosos.

Nos Dez Mandamentos, ou como se chamavam originariamente, “As Dez Palavras” aparece o verbo “rasah”. Indicava a prática de um homicídio grave. Na realidade “rasah” aparece nos textos bíblicos apenas quarenta e seis vezes contra mais de duzentas outras expressões que significam “matar”. Tudo parece indicar que nas distinções entre as penas aplicáveis aos homicidas já existia a clara definição entre homicídio simples, culposo e qualificado: era prevista a pena de morte no Levítico 24,17; a maldição era a pena em Deuteronômio 27,24. Em Números  35,6 o “rasah” tornava o agente sujeito a vingança de sangue, sem direito a asilo, se a morte fosse levada a cabo por ódio ou pura maldade. Ao final vê-se que a pena capital era limitada apenas aos casos de homicídio premeditado. [1]

João Franco






Catecismo da Igreja Católica
A liberdade do homem
1730. Deus criou o homem racional, conferindo-lhe a dignidade de pessoa dotada de iniciativa e do domínio dos seus próprios atos. «Deus quis "deixar o homem entregue à sua própria decisão"(Sir 15, 14), de tal modo que procure por si mesmo o seu Criador e, aderindo livremente a Ele, chegue à total e beatífica perfeição» (29):
«O homem é racional e, por isso, semelhante a Deus, criado livre e senhor dos seus atos» (30).

I. Liberdade e responsabilidade
1731. A liberdade é o poder, radicado na razão e na vontade, de agir ou não agir, de fazer isto ou aquilo, praticando assim, por si mesmo, ações deliberadas. Pelo livre arbítrio, cada qual dispõe de si. A liberdade é, no homem, uma força de crescimento e de maturação na verdade e na bondade. E atinge a sua perfeição quando está ordenada para Deus, nossa bem-aventurança.

1732. Enquanto se não fixa definitivamente no seu bem último, que é Deus, a liberdade implica a possibilidade de escolher entre o bem e o mal, e, portanto, de crescer na perfeição ou de falhar e pecar. É ela que caracteriza os atos propriamente humanos. Torna-se fonte de louvor ou de censura, de mérito ou de demérito.

1733. Quanto mais o homem fizer o bem, mais livre se torna. Não há verdadeira liberdade senão no serviço do bem e da justiça. A opção pela desobediência e pelo mal é um abuso da liberdade e conduz à escravidão do pecado (31).

1734. A liberdade torna o homem responsável pelos seus atos, na medida em que são voluntários. O progresso na virtude, o conhecimento do bem e a ascese aumentam o domínio da vontade sobre os próprios atos.

1735. A imputabilidade e responsabilidade dum ato podem ser diminuídas, e até anuladas, pela ignorância, a inadvertência, a violência, o medo, os hábitos, as afeições desordenadas e outros fatores psíquicos ou sociais.

1736. Todo o ato diretamente querido é imputável ao seu autor.

Assim, depois do pecado no paraíso, o Senhor pergunta a Adão: «Que fizeste'?» (Gn 3, 13). O mesmo faz a Caim (32). Assim também o profeta Natan ao rei David, após o adultério com a mulher de Urias e o assassinato deste (33).

Uma ação pode ser indiretamente voluntária, quando resulta duma negligência relativa ao que se deveria ter conhecido ou feito, por exemplo, um acidente de trânsito, provocado por ignorância do código da estrada.

1737. Um efeito pode ser tolerado, sem ter sido querido pelo agente, por exemplo, o esgotamento duma mãe à cabeceira do seu filho doente. O efeito mau não é imputável se não tiver sido querido nem como fim nem como meio do ato, como a morte sofrida quando se levava socorro a uma pessoa em perigo. Para que o efeito mau seja imputável, é necessário que seja previsível e que aquele que age tenha a possibilidade de o evitar como, por exemplo, no caso dum homicídio cometido por um condutor em estado de embriaguez.

1738. A liberdade exercita-se nas relações entre seres humanos. Toda a pessoa humana, criada à imagem de Deus, tem o direito natural de ser reconhecida como ser livre e responsável. Todos devem a todos este dever do respeito. O direito ao exercício da liberdade é uma exigência inseparável da dignidade da pessoa humana, nomeadamente em matéria moral e religiosa (34). Este direito deve ser civilmente reconhecido e protegido dentro dos limites do bem comum e da ordem pública (35).

II. A liberdade humana na economia da salvação
1740. Ameaças à liberdade. O exercício da liberdade não implica o direito de tudo dizer e fazer. É falso pretender que «o homem, sujeito da liberdade, se basta a si mesmo, tendo por fim a satisfação do seu interesse próprio no gozo dos bens terrenos»(36). Por outro lado, as condições de ordem econômica e social, política e cultural, requeridas para um justo exercício da liberdade, são com demasiada frequência desprezadas e violadas. Estas situações de cegueira e de injustiça abalam a vida moral e induzem tanto os fracos como os fortes na tentação de pecar contra a caridade. Afastando-se da lei moral, o homem atenta contra a sua própria liberdade, agrilhoa-se a si mesmo, quebra os laços de fraternidade com os seus semelhantes e rebela-se contra a verdade divina.

Resumindo:
1743. «Deus [...] deixou o homem entregue à sua própria decisão» (Sir 15, 14), para que ele possa aderir livremente ao seu Criador e chegar assim à perfeição beatífica (40).

1744. A liberdade é a capacidade de agir ou não agir e, assim, de realizar por si mesmo ações deliberadas. Atinge a perfeição do seu ato, quando está ordenada para Deus, supremo Bem.

1745. A liberdade caracteriza os atos propriamente humanos. Torna o ser humano responsável pelos atos de que é autor voluntário. O seu agir deliberado pertence-lhe como próprio.

1746. A imputabilidade ou responsabilidade duma ação pode ser diminuída, ou suprimida, por ignorância, violência, medo e outros fatores psíquicos ou sociais.

1747. O direito ao exercício da liberdade é uma exigência inseparável da dignidade do homem, sobretudo em matéria religiosa e moral. Mas o exercício da liberdade não implica o suposto direito de tudo dizer ou de tudo fazer.



[1] André Chouraqui, A Bíblia - Êxodo pg. 249  Imago Editora.

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