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domingo, 27 de maio de 2012

Espaço do acadêmico - Vinicius Passos


Propriedade, posse e detenção no crime de furto





É sabida a ideia de que o Direito Penal tem como uma de suas finalidades a proteção de bens jurídicos considerados relevantes para a sociedade, sendo, em tempos de capitalismo crescente, o patrimônio um dos mais importantes de seus tutelados, podendo ser atingido de diversas formas e caracterizando-se o crime de furto um os mais corriqueiros delitos patrimoniais.

Versa o art. 155 do Código Penal acerca da referida violação:

Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel:
Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.

Vários são os pormenores contidos nesse artigo. Salienta-se aqui um dos mais polêmicos dele, estabelecendo a diferenciação entre propriedade, posse e detenção da coisa, diferenciação esta essencial para a tipificação de conduta em algumas situações comuns do cotidiano penal. Fato é que esta esfera do Direito não se debruça numa resolução conceitual a fim de resolver esse impasse, fazendo-se necessário o uso dos conceitos civis, não unânimes, diga-se de passagem, acerca da questão. 

Entende-se por propriedade a qualidade de ter domínio sobre a coisa. Isto é, em termos leigos, é proprietário o dono de fato e de direito do objeto. A ideia de posse é menor que a de propriedade, há até quem defenda que esta não é direito, apenas um fato, uma vez que consiste na disposição e/ou uso de coisa, sem necessariamente ser o proprietário desta, sendo,considerada legal, e protegida pelo ordenamento,  mediante anuência do proprietário, ou apenas para a utilização seguida de devolução. Há, portanto, a possibilidade de alguém ser possuidor sem necessariamente ser proprietário.

Quanto a detenção, há um pouco mais de complexidade à respeito. Arnold Wald, ao conceituar o instituto, define-o como uma espécie de posse, sem, entretanto, ter proteção jurídica, mas a doutrina não é nada unânime quanto a isso. Doutrinadores consagrados alegam o contrário, como Bittencourt ao dizer que "bens jurídicos protegidos diretamente são a posse e a propriedade da coisa móvel, como regra geral, e admitimos também a própria detenção como objeto da tutela penal" (BITTENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal, vol. 3. Parte Especial. São Paulo: Saraiva, 7ª edição, 2011, p.31.) defendendo, claramente a tutela da detenção pelo Direito Penal, sendo, pelo menos ainda, parte de uma corrente minoritária.

A importância na conceituação desses termos dá-se na esfera a imputabilidade. Em um caso, por exemplo, de um veículo que sofre furtos sucessivos, tem-se, pelo entendimento majoritário, que apenas o primeiro autor de furto pode ser imputado, os demais possuem mera detenção do objeto, não fazendo este, portanto, parte do seu patrimônio, o que, considerado o furto, não representaria uma detração de seus bens, inviabilizando, por conseguinte, a proteção jurídica nesse caso. Há nesse caso, apesar da sucessão de eventos delituosos do mesmo tipo, um único sujeito passivo na situação, que seria o que acumula a posse e a propriedade do bem.

Necessária é uma perspectiva acerca do caso tendo como ponto de partida a perda patrimonial. Independente do que o ato represente em termos práticos, não há de se falar em proteção para quem não tem direito a esta, no sentido de que, aliando-se a idéia de que a mera detenção não incorpora, em termos legais, sequer temporariamente o objeto ao patrimônio de quem seja, não há de se falar em imputabilidade nessa situação. Diferente de quem tem posse, podendo até ser sujeito passivo do próprio proprietário do objeto no crime de apropriação indébita (art. 168 CP). Esse é, inclusive o entendimento de Rogério Greco, ao afirmar que “não há como enxergar tal perda para o mero detentor, não havendo a possibilidade de a detenção da coisa se valer da proteção jurídica.” (GRECO, Rogério. Curso de direito penal, vol.3-parte especial. Rio de Janeiro: Impetus, 7ªedição, 2010, p.11.),  depreendendo-se, portanto, a possibilidade polêmica de procedência da máxima popular de que “ladrão que rouba ladrão tem cem anos de perdão”.

Toda essa teorização fortalece a tese de que assim como as relações sociais como um todo, os crimes podem ser mais complexos do que se possa imaginar, necessitando de atenção redobrada dos operadores do direito, a fim de que se possa manter a ordem social e fazer valer aquilo que preconiza o nosso ordenamento.



Referências:

BITTENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal, vol. 3. Parte Especial. São Paulo: Saraiva, 7ª edição, 2011, p.31.

GRECO, Rogério. Curso de direito penal, vol.3-parte especial. Rio de Janeiro: Impetus, 7ªedição, 2010, p.11.

MUNIZ, Adriano Sampaio: Furto: análise crítica. Disponível em: < http://jusvi.com/pecas/29769>. Acesso em 05 de maio de 2012.

BRANDÃO, Sara: O crime de furto e o princípio da insignificância. Disponível em: < http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=9217>. Acesso em 06 de maio de 2012.

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