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Des. Paulo Moacir Aguiar Vieira –
Presidente e Relator.
RELATÓRIO
Des. PAULO MOACIR AGUIAR VIEIRA
(Presidente e Relator):
João Romeu Pereira Moraes foi denunciado na 4ª Vara
Criminal da Comarca de Santa Maria, como incurso nas sanções dos arts. 155, §
4º, incs. I e IV, do CP; art. 16 da Lei nº 6.368/76, na forma do art. 69,
caput, do CP, por ter, no dia 16.05.97, por volta de 1h30min, na Rua Astrogildo
de Azevedo, frente ao nº 362, nesta cidade, em acordo de vontades e conjugando
esforços com terceiro não identificado, mediante quebra do vidro do carona e do
painel do veículo Parati, placas IBZ-4437, subtraído, para si e seu comparsa,
um toca-fitas e rádio marca Bosch, o isqueiro do carro e um acessório de
telefone, tudo de propriedade de Renan Vicente Brum Chami.
Enquanto o terceiro cuidava a
aproximação de pessoas, o denunciado quebrou o vidro do veículo e do interior
dele subtraiu os objetos referidos.
No mesmo contexto fático acima narrado,
o denunciado trazia consigo, sem autorização, para fins de uso próprio, cerca
de 1,0g de Cannabis Sativa Lineu, vulgo maconha, cujos princípios ativos causam
dependência psíquica.
Citado, o réu deixou de comparecer ao
interrogatório, tornando-se revel. Foi nomeado defensor dativo que apresentou
defesa. Colhida a prova oral e decorrido o prazo do art. 499 do CPP, as partes
apresentaram alegações finais; o Ministério Público pediu pela procedência da
ação nos termos da denúncia e a defesa postulou, preliminarmente, a sua oitiva
para que fosse interrogado, o que foi deferido na fl. 104 e verso; no mérito,
pede pela sua absolvição.
Sentenciando, a Drª Juíza de Direito
julgou parcialmente procedente a denúncia para condenar o acusado por infração
ao art. 155, § 4º, incisos I e IV, às penas de 2 anos e 1 mês de reclusão, em
regime aberto e 12 dias-multa, à razão de 1/30 do salário mínimo vigente à
época do fato e às penas de 6 meses de detenção, em regime aberto e 20
dias-multa, atribuindo a cada dia o valor de CR$ 25,00 (vinte e cinco
cruzeiros), corrigidos monetariamente a partir de 21.10.76, por infração ao
art. 16 da Lei nº 6.368/76.
Inconformado, apelou o réu objetivando a
sua absolvição do delito capitulado no art. 16 da Lei 6.368/76 e/ou a
desclassificação prevista no art. 155, § 2º, do CP.
O Ministério Público, em ambos os graus,
manifestou-se pela improcedência do apelo.
É o relatório.
VOTO
Des. PAULO MOACIR AGUIAR VIEIRA (Presidente
e Relator): Preliminarmente, decreto a extinção da punibilidade pela prescrição
da pretensão punitiva quanto ao delito de porte de entorpecentes. No que tange
à condenação remanescente, alusiva ao crime de furto, dou parcial provimento à
inconformidade, para afastar a qualificadora do arrombamento, conceder ao réu o
benefício do furto privilegiado, diminuir a pena imposta e decretar a extinção
da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva.
A – Crime do art. 16 da Lei nº 6.368/76:
A pena concretizada na sentença é de
seis (6) meses de detenção e vinte (20) dias-multa, no valor unitário de CR$
25,00. Trata-se de pena carcerária inferior a um ano. O prazo prescricional é o
do art. 109, VI, do CP.
O réu tinha 19 anos de idade à época do
fato, reduzindo-se de metade, em face disso, o prazo prescricional (art. 115 do
CP). Esse prazo, assim, é de um ano.
Tendo transcorrido mais de um (1) ano
entre a data do recebimento da denúncia (21.05.97) e a da sentença condenatória
(08.06.98), incumbe decretar a extinção da punibilidade pela prescrição da
pretensão punitiva no tocante à condenação por esse delito, cancelados os efeitos
da condenação (arts. 107, IV, 109, VI, 110, parágrafo único, 115 e 118 do CP).
B – Crime de furto:
A prova material é satisfatória.
Em poder do acusado, foram apreendidos
um pedaço de pedra ou de “concreto”, um acendedor de cigarros de automóvel, um
botão de toca-fitas e um acessório de telefone celular (fl. 10).
Consta à fl. 44 o auto de avaliação dos
bens subtraídos.
A vítima declarou, em juízo (fl. 86),
que só não recuperou o rádio toca-fitas. Esse não foi apreendido.
A perícia de fl. 41 mostra ter sido
quebrado o vidro da porta do lado direito do automóvel da vítima.
Também a prova da autoria ou da
co-participação delitiva do apelante no evento é bastante sólida.
A negativa do réu, constante do
interrogatório (fl. 104), ficou isolada
Os PMs Nei Edmilson Alves e Jadir
Medeiros de Souza disseram em juízo que o réu foi detido, portando em seu poder
acessórios do aparelho de som e um adaptador de telefone celular, pertencentes
à vítima. Foi apontado por um cidadão que se encontrava no local do fato como
sendo um dos autores do crime (fl. 60 e v.).
A testemunha Paulo Roberto Machado da
Cunha declarou ter presenciado quando o réu, juntamente com outro indivíduo,
achava-se dentro do veículo da vítima, após ter ouvido o barulho do
arrombamento; encontrava-se em sua residência; em face disso, acabou chamando a
polícia e indicou para os PMs o rumo que tomaram os infratores; o réu acabou
sendo preso nas proximidades, oportunidade em que admitiu a autoria (fl. 86v).
A vítima disse, perante o magistrado,
que ao tomar conhecimento do fato, dirigiu-se à Delegacia de Polícia; lá
reconheceu os acessórios encontrados em poder do réu, como sendo de sua
propriedade (fl. 86).
Nenhuma excludente de criminalidade vem
em favor do réu. O juízo de reprovabilidade penal contra ele se impunha.
A qualificadora do concurso de agentes
acha-se configurada, pois as testemunhas referem a presença de um outro
indivíduo juntamente com o réu, dentro do automóvel, durante o evento, o qual
logrou fugir.
Entretanto, é de ser afastada a
qualificadora do art. 155, § 4º, I, do CP, pois o obstáculo do vidro quebrado
do automóvel é inerente ao próprio bem que, em parte, foi subtraído.
Aqui, o automóvel, com todos os seus
acessórios, deve ser entendido como constituindo, na verdade, um único bem.
Assim tem entendido respeitável parcela
da jurisprudência.
Decidiu o Tribunal de Alçada de São
Paulo, que o rompimento de obstáculo, que não é exterior à coisa, como o quebra-vento,
em relação ao automóvel, não qualifica o delito de furto. E aqui, não interessa
se o réu pretendia “o mais” (subtrair o próprio automóvel) ou apenas alguns
acessórios do carro (Apelação 279.063, RT 574/366, apud CELSO DELMANTO, Código
Penal Comentado, 1986, p. 268).
Nesse sentido, sempre me posicionei e
fui voto vencedor em várias decisões da antiga 2ª Câmara Criminal do Tribunal
de Alçada gaúcho.
Dou, assim, o apelante como incurso nas
sanções do art. 155, § 4º, IV, do CP, tão-somente.
A hipótese recomenda a concessão ao réu
do benefício do furto privilegiado.
Copiosa é a jurisprudência no sentido da
compatibilidade entre o aludido benefício e o furto qualificado pelo concurso
de agentes (Julgados do TACrSP, 71/240, 69/404, 69/355). No Tribunal de Alçada
gaúcho, e também no TJRGS, inúmeras são, de igual sorte, as decisões nesse sentido
O réu é primário, como reconheceu a
sentença.
O valor de um salário mínimo “não deve
ser considerado como teto fatal e intransponível” (TACrSP, Apelação 268.143,
Julgados 69/397). Essa é a opinião de CELSO DELMANTO, que considera que o valor
igual ao salário mínimo pode ser ultrapassado em casos especiais (obra citada,
p. 267).
Na espécie, a avaliação do toca-fitas da
vítima foi feita de modo indireto (fl. 44).
Os peritos chegaram à cifra de R$ 196,00
o que equivale a pouco menos que um salário mínimo e meio.
Deve-se ponderar, no entanto, que o réu,
além de primário, era, na época do fato, um jovem de 19 anos de idade, sem
antecedentes criminais, conforme concluiu a sentença (fl. 109).
Assim, reformulo o apenamento.
A pena-base deve ser colocada no mínimo.
O réu é primário e não tem antecedentes, segundo a sentença. Pouco se sabe
sobre a sua personalidade ou conduta social anterior. Agiu com dolo comum.
Motivos próprios do crime. O comportamento da vítima não contribuiu para o
fato. Conseqüências alusivas à perda do toca-fitas e à quebra de um vidro.
Diminuo, assim, a pena-base para 2 anos
de reclusão.
Em face da atenuante da menoridade,
diminuo a referida sanção de 6 meses.
Esta Câmara Criminal tem firmado
entendimento no sentido de que as atenuantes podem fazer retroceder a pena a
quantitativo inferior ao mínimo legal, quando as circunstâncias judiciais são
favoráveis ao réu.
Diminuo, portanto, a pena carcerária do réu
para um (1) ano e seis (6) meses de reclusão.
Tendo reconhecido em favor do réu o
benefício do art. 155, § 2º, do CP, reduzo de metade a referida sanção, para
concretizá-la em nove (9) meses de reclusão.
A sanção pecuniária é diminuída para dez
(10) dias-multa no valor unitário mínimo de lei.
Extinção da punibilidade pela prescrição
da pretensão punitiva:
Tendo transcorrido mais de um ano entre
a data do recebimento da denúncia (21.05.97) e a data da sentença condenatória
recorrível (08.06.98), incumbe decretar a extinção da punibilidade pela
prescrição da pretensão punitiva, pelos mesmos fundamentos invocados no tocante
ao delito de porte de entorpecentes (arts. 107, IV, 109, VI, 110, § 1º, 115 e
118 do CP), cancelados os efeitos da condenação.
Em resumo, preliminarmente, decreto a
extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva, em relação ao
delito do art. 16 da Lei nº 6.368/76; e no que diz respeito à condenação
remanescente pelo crime de furto, afasto a qualificadora do art. 155, § 4º, I,
do CP, concedo ao réu o benefício do art. 155, § 2º, do CP e reduzo a pena
imposta, concretizando-a em nove (9) meses de reclusão e dez (10) dias-multa no
valor unitário mínimo de lei, declarando, de igual sorte, em relação a essa, a
extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva, cancelados os
efeitos da condenação.
Des. ARAMIS NASSIF (Revisor vencido em
parte): Com a devida vênia, acompanho em parte o Relator.
Fonte imagem: Pinterest
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