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sábado, 14 de outubro de 2017

Sentença: Contrato de morte



MULHER PEDE ANULAÇÃO DO  CONTRATO QUE FEZ PARA SEU ASSASSINATO


Circunscrição :7 - TAGUATINGA Processo :2015.07.1.011354-4 
Vara : 204 - QUARTA VARA CIVEL DE TAGUATINGA
SENTENÇA Vistos etc.

Trata-se de processo de conhecimento, sob o rito comum, em que ________________, devidamente qualificado nos autos supramencionados, formula pedido declaratório de anulabilidade de negócio jurídico em desfavor de _______________________, também qualificado. Para tanto, alega a parte autora, em apertada síntese, que, após diversos anos de atividade laborativa, desenvolveu patologia psiquiátrica com quadro depressivo-ansioso crônico, com aspecto suicida, comprometendo-se sua capacidade de trabalho. Afirma que, sem conseguir suicidar-se, acabou por procurar alguém que pudesse tira-lhe a vida, vindo a encontrar o réu. 

Anota que o réu lhe exigiu pagamento, levando-se consigo diversos produtos, além do veículo automotor GM/Prisma Maxx, branco, placa _________, RENAVAM _______________, CHASSI _________________, este por intermédio de outorga de instrumento procuratório. 

Comunica que o réu, após receber o veículo automotor e a procuração, deixou o local, sem atender, inclusive, a ligações telefônicas. Relata que comunicou o fato à autoridade policial. Discorre sobre o direito aplicável à espécie. Requer, de início, a concessão do benefício da gratuidade da Justiça e, ao final, a procedência do pedido para declarar a nulidade do negócio jurídico firmado com a parte ré, com o retorno das partes ao estado anterior, condenando o réu nos consectários legais. 

A petição inicial veio instruída com documentos de fls. 19/53. Pelo Juízo, fls. 88/90, indeferiu-se o pedido de concessão de gratuidade de Justiça. Angularizada a relação jurídico-processual, a parte ré apresenta resposta, modalidade contestação, fls. 118/122, sem arguir questão prejudicial ou preliminar de mérito. Impugna, na matéria de fundo, os fatos articulados pela autora. Requer, ao final, a concessão dos benefícios da gratuidade da Justiça e, ao final, a improcedência do pedido. 

Réplica, fls. 126/128. Instadas a especificaram provas, das partes se manifestaram nos autos. Em audiência de tentativa de conciliação, instrução e julgamento, atermada às fls. 157/160, infrutífera a possibilidade de composição. Procedeu-se ao depoimento pessoal da autora e à oitiva da Maria de Fátima Silva, dispensadas as demais pelas partes. 

Encerrada a instrução, as partes, em debates orais, manifestaram de forma remissiva às peças até então apresentadas nos autos. Os autos foram anotados conclusos para sentença. 

É o relatório. DECIDO. 

Cuida-se de processo de conhecimento, sob o rito comum, em que se parte autora formula pretensão declaratório de nulidade de negócio jurídico frente ao réu. Perscrutando os autos, divisa-se, inicialmente, a presença dos pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo, assim como das condições de existência da ação. Não há, em contrapartida, qualquer nulidade processual a ser declarada ou sanada pelo Juízo. Na matéria de fundo, cabe tecer alguns comentários. Inicialmente, anota-se que a declaração de vontade é pressuposto do negócio jurídico (plano da existência) e sua exteriorização livre e consciente é elemento de validade do negócio jurídico (plano da validade). 

Os negócios jurídicos realizados com base em uma manifestação de vontade em desacordo com o verdadeiro querer do agente, nas hipóteses de erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão - os chamados vícios de consentimento - são anuláveis. Vale consignar que, em função da presunção de veracidade dos atos praticados e dos princípios da boa-fé e da segurança das relações jurídicas, para a anulação do negócio jurídico exige-se prova inequívoca de que a declaração de vontade foi manifestada de forma viciada. 

Outrossim, nulo é o negócio jurídico quando celebrado por pessoa absolutamente incapaz, for ilícito, impossível ou indeterminado o seu objeto, o motivo determinante,comum a ambas as partes, for ilícito, não se revestir de forma prescrita em lei, for pretérita alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade, tiver por objetiva fraudar a lei imperativa ou a lei taxativamente declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção. Também se reputa nulo o negócio jurídico quando este for objeto de simulação, projetando-se, contudo, validade do que se dissimulou, se válido for na substância e na forma. 

A disciplina civilista, em linhas, não procura estabelecer diferenciação pormenorizada dos institutos, mas nas consequências da eiva, de modo a projetar ou não efeitos. Trabalhou-se nulidade, diga-se absoluta, e anulabilidade. A primeira, nulidade absoluta, ou simplesmente nulidade, se verifica quando a norma, o ato jurídico ou o negócio jurídico é contrário à lei ou sofre de algum vício essencial relativo à forma prevista em lei para a prática do ato, à qualidade das pessoas que participam da sua criação, ao objeto do ato e às condições em que se dá a manifestação de vontade. Impede-se que ato produza qualquer efeito, desde o momento da sua formação, tendo como fundamento o interesse social de que o ato praticado não ganhe força, de modo que as causas de nulidade se escoram em razões de ordem pública e não privada. 

Pode ser arguida por qualquer interessado e não está sujeita à prescrição - a norma, o ato e o negócio jurídico nulos não podem ser ratificados, não são suscetíveis de confirmação, nem convalescem pelo decurso do tempo. Já a anulabilidade, verifica se em caso de vícios de menor gravidade, só podendo ser invocada pelas pessoas diretamente prejudicadas, dentro do prazo estabelecido por lei. Remanesce, ainda, a idéia de negócio jurídico inexistente, objeto de abordagem meramente doutrinária, na qual consistiria que o ato não tem aptidão para existir, por lhe faltar requisitos essenciais à sua existência, de modo a não gerar qualquer efeito no mundo jurídico. Outrossim, vale consignar que, em função da presunção de veracidade dos atos praticados e dos princípios da boa-fé e da segurança das relações jurídicas, para a anulação do negócio jurídico exigese prova inequívoca de que a declaração de vontade foi manifestada de forma viciada. 

No caso, tem-se como fundamento para o pedido de anulidade do negócio jurídico o estado de enfermidade da parte autora em consentir com a alienação do veículo automotor ao réu, sob a promessa de que este, a pedido daquela, matá-la-ia. A hipótese dos autos, em verdade, não diz respeito a vício de consentimento, mas de própria nulidade do negócio jurídico, dado o objeto ilícito. Pelo acervo fático-probatório, não ficou demonstrado a eiva do negócio jurídico a demandar, seja sua nulidade, seja a sua anulabilidade. Com efeito, o depoimento prestado pela parte autora não foi firme nesse sentido, apresentando-se, em alguns momentos, contradições, quando ao pacto macabro. A testemunha ouvida, embora discursasse sobre o estado de saúde da parte autora, não visualizou o negócio jurídico nem presenciou elementos a ele circunstanciais. Dos autos, nota-se a existência de instrumento procuratório dado em causa própria, in re suam, com estipulação de preço e com cláusula de irrevogabilidade ou de irretratabilidade, o que deixa entrever, no momento de sua confecção, nenhum mal que acometesse a autora que inviabilizasse de manifestar vontade frente ao tabelionato público. 

Na espécie, incumbia à autora a prova do fato constitutivo do seu direito, cujo ônus não se libertou, razão porque o pedido formulado deve ser julgado improcedente. 

ANTE O EXPOSTO e por tudo mais que dos autos consta, não me delongando sobre o tema, julgo IMPROCEDENTE o pedido e, em conseqüência resolvo o processo, em seu mérito, com fulcro no artigo 487, inciso I, do mencionado diploma legal. Sentença registrada eletronicamente nesta data. 

Publique-se. Intimem-se. 

Em razão da sucumbência, condeno a parte autora a pagar as custas processuais, assim como os honorários advocatícios da contraparte, estes arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor atribuído à causa, em atenção ao comando previsto no artigo 85 do Código de Processo Civil. Interposto recurso de apelação por quaisquer das partes, independentemente de análise dos requisitos de admissibilidade da impugnação, apresentas das contrarrazões ou transcorrido em branco o seu prazo, subam os autos ao egrégio Tribunal de Justiça, com as devidas homenagens. 

Transitada em julgado a presente decisão, transcorrido em branco o prazo de 15 (quinze) dias para cumprimento voluntário ou, sucessivo, para abertura da fase expropriatória, arquivem-se os autos procedidas às comunicações e adotadas as cautelas legais. Taguatinga - DF, terça-feira, 07/02/2017 às 13h27. Processo Incluído em pauta : 07/02/2017



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