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domingo, 29 de outubro de 2017

Furto

Consumação


É importante para os que lidam com a aplicação do Direito Penal sempre pensar sobre o tipo e sua aplicação prática. A sociedade está em constante evolução e é impossível pretender-se manter estática a norma, embora tal tentação seja constante, pois nos sentimos mais seguros com o que conhecemos e tendemos a aplicar sempre as soluções tradicionais.  Porém os padrões clássicos de solução das questões não tem sido eficazes, como prova o aumento das violações aos direitos.  O profissional que se distingue, afastando-se da cultura morna da acomodação que reduz os riscos pessoais, é aquele que busca vislumbrar novos ângulos nos velhos problemas e examina com lógica uma solução mais realista e benéfica a todos.

A seguir algumas visões dos nossos doutrinadores:


MOURA TELES:
“O furto é um crime material e instantâneo de efeitos permanentes. Para sua consumação, é necessária a produção do resultado, que é a modificação da posse da coisa pela vítima, a qual deve ser invertida, passando a do agente. É a denominada teoria da inversão da posse.
A consumação vai ocorrer em um só momento, esgotando-se aí, sem continuação do momento consumativo como ocorre nos crimes permanentes. Consumado  o furto, seus efeitos podem durar tempo maior ou menor, pouco importa, porque já terá se realizado o crime em toda a sua integridade.
Doutrina e jurisprudência falam em dois requisitos para a verificação da consumação. Para uma corrente é necessário que a coisa tenha saído da esfera de disponibilidade da vítima. Outros defendem que o crime somente se consuma quando o agente tem a posse mansa e pacífica, ainda que por tempo diminuto.
Ora, se o resultado no furto é a perda da posse, basta que ela ocorra, o que acontece no exato momento em que o sujeito ativo perde a possibilidade de exercer qualquer poder sobre a coisa. No tipo há um único verbo: subtrair. Tirada a coisa do dono, com o fim de assenhoramento, realizou-se integralmente o tipo. A posse tranquila da coisa só seria exigível se o tipo contivesse, além do verbo subtrair, outro verbo: ter. Aí, sim, a consumação somente ocorreria quando o agente tivesse a coisa com tranqüilidade.
 O momento consumativo ocorre quando a coisa sai da “esfera de posse e disponibilidade do sujeito passivo, ingressando na livre disponibilidade do autor, ainda que não obtenha a posse tranquila” (Damásio, v. 2 p. 309). Haverá furto consumado no exato momento em que o ofendido não puder mais dela dispor, em que deixa de sobre ela exercer o poder que exercia quando em sua posse. É obvio que se o agente consegue ter a posse tranquila o furto é consumado, mas o foi antes disso, quando a coisa saiu da esfera de disponibilidade da vítima.
De consequência, quando o agente é perseguido, até mesmo pela própria vítima, sendo a coisa recuperada, haverá crime consumado.” (TELES, Moura. Direito Penal. Parte Especial 2ª Ed. Atlas)
  
MIRABETE:
“Várias são as teorias criadas para explicar a caracterização e consumação do furto: (1) a concretatio (basta tocar a coisa);
 (2) a apprehensio rei (é suficiente segurá-la);
(3) a amotio (exige-se a remoção do lugar);
(4) a ablatio (a coisa é colocada no lugar a que se destinava, em segurança. A jurisprudência consagrou uma situação intermediária entre as últimas teorias, a da inversão da posse, entendendo-se consumado o furto quando o agente tem a posse tranquila da coisa, ainda que por pouco tempo, fora da esfera de vigilância da vítima. Já se decidiu que, embora a res furtiva não tendo saído do estabelecimento comercial, porque o réu a escondeu, para posteriormente levá-la, o fato é que a vítima dela não pode dispor enquanto não encontrada pela polícia, consumando-se o crime. Também há posse tranquila quando ocultada em esconderijo.” (MIRABETE, Manual de Direito Penal V II 26ª Edição RT)

         “Já se decidiu que, embora a res furtiva não tenha saído do estabelecimento comercial, porque o réu a escondeu, para posteriormente levá-la, o fato é que a vitima dela não pode dispor enquanto não encontrada pela polícia, consumando-se o crime.” JTACrSP 65/434. (Manual de Direito Penal V. II pág. 226 Mirabete. 22ª edição 2004 Ed. Atlas)
(Roubo) “... deve ser reconhecida a consumação ainda que o agente tenha sido seguido ou perseguido e preso em flagrante delito (RT 688/ 355). É irrelevante a circunstância de não se ter locupletado o agente com a coisa roubada.” (RTJ 97/903). (Manual de Direito Penal Vol. II pág. 241 Mirabete. 22ª edição 2004 Ed. Atlas)


CÉZAR R BITTENCOURT

(Art. 157 - Roubo. Consumação) Como no furto o roubo próprio consuma-se com a retirada da coisa da esfera de disponibilidade da vítima. Vem-se firmando o entendimento sobre a desnecessidade de posse tranquila, mesmo passageira, do agente. No roubo impróprio, consuma-se com o emprego da violência ou grave ameaça à pessoa, após subtração.” (Cezar R Bittencourt, C P Comentado, pág. 675 Ed Saraiva)
  
FERNANDO CAPEZ:
“A consumação do furto ocorre com a inversão da posse, ou seja, no momento em que o bem passa da esfera de disponibilidade da vítima para a do autor. A subtração se opera no exato instante em que o possuidor perde o poder e o controle sobre a coisa, tendo de retomá-la porque já não está mais consigo. Basta, portanto, que o bem seja retirado do domínio de seu titular e transferido para o autor ou terceiro.  Não se exige que, além da subtração, o agente tenha a posse tranquila e desvigiada da res. Em sentido contrário há o posicionamento exigindo a posse mansa e pacífica da res para a consumação do furto. Desse modo, segundo essa corrente, para o aperfeiçoamento completo da figura típica exige-se: retirada do bem da esfera de disponibilidade da vítima mais posse tranquila da res, ainda que por curto período te tempo. Assim, além da subtração, haveria a necessidade de que o agente retivesse a coisa fora do alcance e vigilância do possuidor, ainda que por alguns instantes (exigência que a nosso ver não é feita pelo tipo). (CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal, v.2. Saraiva.)

DAMÁSIO DE JESUS
“O furto atinge a consumação no momento em que o objeto material é retirado da esfera de posse e disponibilidade do sujeito passivo, ingressando na livre disponibilidade do autor, ainda que este não obtenha a posse tranquila. Em regra a consumação exige deslocamento do objeto material. Isso, porém não leva à conclusão de que o transporte da coisa seja imprescindível à consumação do crime. Consuma-se o delito no momento em que a vítima não pode mais exercer as faculdades inerentes à sua posse ou propriedade, instante em que o ofendido não pode mais dispor do objeto material. Em alguns casos isso ocorre ainda que não haja deslocação material da coisa. È possível assim que o furto atinja a consumação em uma cela de prisão, sendo o objeto subtraído de um preso por outro. No instante em que a vítima não sabe mais onde se encontra o objeto material está consumado o furto. (...) Ocorre o mesmo no caso de uma empregada esconder uma joia no seio.” (Direito Penal Damásio de Jesus. Vol. 2 pág. 273 Ed Saraiva)

Por outro lado,
NELSON HUNGRIA
No seu clássico “Comentários ao Código Penal” (vol. VII pág., 25 Ed Forense, 1958), Nélson Hungria, autor sempre muito consultado pelos nossos doutrinadores, assim se posicionava sobre a questão da consumação do furto:
“ [...] Que se deve entender por essa transferência de posse, ou, melhor, quando se pode dizer realizada tal transferência? Afirmam uns que surge a posse do ladrão quando este consegue afastar-se da esfera de atividade patrimonial, de custódia ou vigilância do dominus, ainda que, perseguido venha a ser imediatamente despojado.  Opinam outros, entretanto, que é necessário estabelecer-se um estado tranquilo, embora transitório, de detenção da coisa por parte do agente. Inclino-me, decididamente, por esta última solução.  Penso, aliás, que é a única aceitável perante o nosso direito positivo. O furto não se pode dizer consumado senão quando a custódia ou a vigilância, direta ou indiretamente exercida pelo proprietário, tenha sido totalmente iludida. Se o ladrão é alcançado, ato seguido a apprehensio da coisa, e vem a ser privado desta, pela força ou por desistência involuntária, não importa que isto ocorra quando já fora da esfera patrimonial do proprietário: o furto deixou de se consumar, não passando da fase de tentativa. [...]  Não se pode chamar posse a simples detenção física por parte do ladrão, sem um só instante de possibilidade de disposição livre e tranquila da res. O furto é uma espoliação da propriedade, e não é espoliado patrimonialmente o dominus que, atacado na sua posse, a defende in continente e a retoma. Para que se possa falar propriamente em perda da posse, em desfalque do domínio, é indispensável que, embora passageiramente, se estabeleça a posse exclusiva e sossegada do ladrão.” [...]
Casos há, todavia, em que o furto tem de ser reconhecido como consumado ainda quando o ladrão e a res furtiva permaneçam no âmbito de atividade patrimonial do lesado. É o caso, por exemplo, da criada que sub repticiamente empolga uma joia da patroa e a esconde no seio ou mesmo nalgum escaninho da casa, para, oportunamente, sem despertar suspeitas, transportá-la a lugar seguro.  Consumou-se o furto. E, por que? Porque desapareceu a possibilidade material, por parte da lesada, de exercer o seu poder de disposição da coisa, cujo paradeiro ignora.”  

STJ:
“A jurisprudência desta Corte, bem como do Supremo Tribunal Federal, firmou a orientação no sentido de que se considera consumado o crime de roubo, assim como o de furto, no momento em que, cessada a violência ou a clandestinidade, o agente se torne possuidor da res furtiva ainda que por curto espaço de tempo, sendo desnecessário que o bem saia da esfera de vigilância da vítima, incluindo-se, portanto, as hipóteses em que é possível a retomada do bem por meio de perseguição imediata.” (STJ, 5ª Turma Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJ 14.11.2005 p. 395).


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