UM EXEMPLO DO LADO
SOMBRIO DA INTERNET:
O CASO DO JOGO DA BALEIA AZUL
SUMÁRIO:
1. INTRODUÇÃO; 2. “JOGO” DA “BALEIA AZUL” E O ENQUADRAMENTO JURÍDICO DOS
“CURADORES” 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS; 4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.
RESUMO
O
presente trabalho abordará o caso recentemente veiculado na imprensa envolvendo
o jogo virtual da baleia azul à luz da legislação penal pátria e tem como
finalidade realizar o enquadramento jurídico dos atos praticados pelos
“curadores” do referido jogo.
Palavras-chave: Direito Penal – Suicídio –
Induzimento ao suicídio – Instigação ao suicídio – Enquadramento jurídico.
1. INTRODUÇÃO
A internet revolucionou a
comunicação no mundo, pois ela tornou possível, através da conexão em rede,
compartilhar informações de forma fácil e rápida, trazendo um universo de dados
e possibilidades impensáveis poucas décadas
atrás. Essa ferramenta facilita, e muito, o acesso ao conhecimento, sendo
importante instrumento, por exemplo, para pesquisas científicas, mas também
pode ser meio utilizado para a prática de crimes, e, nesse aspecto, existe
grande preocupação especialmente em relação aos mais vulneráveis: crianças e
adolescentes.
Atualmente, o que se observa é uma
geração cada vez mais conectada: smartphones, tablets, notebooks,
jogos online, permanecendo-se
incontáveis horas em comunicação com conhecidos e desconhecidos. Alguns
programas de controle virtual a serem utilizados pelos pais não conseguem
competir com as inúmeras possibilidades de vivenciar “intensamente” esse mundo
virtual, o qual, sem o devido cuidado, pode ter consequências reais, como sequestros,
pedofilia, e a última novidade noticiada: induzimento ao suicídio.
O Brasil preocupado com a
vulnerabilidade de crianças e adolescentes alterou o Estatuto da Criança e do
Adolescente para incluir dentre os crimes próprios os arts. 241-A, 241-B, 241-C,
241-D, todos relacionados à exposição sexual de crianças e jovens visando
inibir a ação de pedófilos, especialmente para alcançar também os virtuais,
responsabilizando ainda o responsável legal pela prestação do serviço, que,
após notificação oficial, não venha a desabilitar o acesso ao conteúdo ilícito.
Também buscou a legislação pátria impedir o que denominou de “invasão de
dispositivo de informática” mediante a edição da lei conhecida como Carolina
Dieckman, Lei 12.737/2012, que altera o código penal para dispor sobre a
tipificação criminal de delitos informáticos, acrescentando os arts. 154-A e
154-B. Foi editado ainda o Marco Civil da Internet, legislação civil, o qual
disciplina o uso da internet no nosso país.
2. “JOGO” DA
“BALEIA AZUL” E O ENQUADRAMENTO JURÍDICO DOS CURADORES
No
caso do “jogo” virtual “baleia azul”, nenhum dos dispositivos legais existentes,
voltados especificamente para questões cibernéticas, têm aplicação, pois se
trata de “jogo” repleto de tarefas-desafio, que incluem desde a automutilação
até o ápice sinistro: a própria morte do usuário do jogo. Não é o caso também,
diferentemente do que se chegou a veicular, de crime de lesão corporal, em
decorrência de automutilação, porque não se admite na esfera penal
interpretação analógica in malan partem, e não existe a previsão
expressa de induzimento à lesão corporal. A consumação do crime previsto no
art. 122 do CP é que se dá em duas hipóteses: pela morte da vítima ou na
ocorrência de lesão corporal grave.[1]
Em relação ao
suicídio, por sua vez, existe a tipificação em relação as condutas instigar,
induzir e prestar auxílio, pois o suicídio, em si, não é ilícito penal. Ou
seja, em tese, a conduta dos “curadores” do “jogo”, pelo que foi noticiado,
pode ser enquadrada na previsão do art. 122 do Código Penal. De acordo Rogerio
Greco[2]:
“Ocorre à participação moral nas
hipóteses de induzimento ou instigação ao suicídio”, esclarecendo que “Induzir significa fazer nascer, criar a
ideia suicida na vítima”, e que “Instigar,
a seu turno, demonstra que a ideia de eliminar a própria vida já existia, sendo
que o agente, dessa forma, reforça, estimula essa ideia já preconcebida”. Ainda
convém lembrar que o parágrafo único do artigo 122 do CP prevê que a pena do
crime será duplicada caso a conduta delituosa seja cometida por motivo
egoístico (art.122, parágrafo único, I), sendo a vítima menor ou tendo reduzida
ou diminuída, por qualquer motivo, sua capacidade de resistência (art.122,
parágrafo único, II).
É de grande importância ressaltar que o suicida
tem que ter o discernimento sobre os seus atos, pois, do contrário, poderá ser
homicídio. Escreve Delmanto: “Poderá haver homicídio se a vítima é forçada a
suicidar-se, ou não tem resistência
alguma.”[3]
Os usuários do jogo
da baleia azul costumam ser jovens que, devido à vulnerabilidade, são mais
facilmente manipulados e induzidos a praticar o ato de suicídio. Registre-se
que não há uma participação material no “jogo” da“baleia azul”, eis que,
segundo Rogério Greco, “Na participação
material o agente auxilia materialmente a vítima a conseguir o seu intento,
fornecendo, por exemplo, o instrumento que será utilizado na execução do
autocídio (revólver, faca, corda para a forca etc.), ou mesmo simplesmente
esclarecendo como usá-lo”. No caso do referido “jogo”, os “curadores”no crime
não fornecem instrumento (revolver, faca, corda, veneno, etc) algum a vítima
para praticar o ato de suicídio, apenas induzem ou instigam (no caso da
instigação, a vítima tem a ideia de se matar pré-estabelecida em sua mente e o
jogo serviu apenas para incentivar ainda mais a praticar o ato de suicídio).
3.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Muito
embora seja constante no universo da Internet a criação de novas formas de
burlar as leis e a criação de outras redes visando que crimes fiquem impunes,
as autoridades também devem se utilizar dos avanços tecnológicos para localizar
os responsáveis. A partir do que foi exposto, percebe-se com nitidez a
necessidade também de que legislação pátria procure rastrear esses caminhos –
por vezes sombrios – da realidade virtual e que sejam desenvolvidos novos dispositivos
para inibir o uso da Internet para fins ilícitos, a fim de que os usuários,
especialmente os mais vulneráveis, sejam protegidos desses criminosos que se
“escondem atrás de uma tela”.
REFERÊNCIAS
DELMANTO, Celso et al. Código penal comentado. 9ª
edição. São Paulo: Saraiva, 2016.
GRECO, Rogério. Código Penal comentado. 11ª edição. Rio de Janeiro, 2017.
Desafio o da Baleia Azul pode
ter feito 1ª vítima fatal em Pernambuco. Disponível em: <http://radiojornal.ne10.uol.com.br/noticia/2017/04/21/desafio-da-baleia-azul-pode-ter-feito-1-vitima-fatal-em-pernambuco-53470>
Acesso em: 21/04/2017.
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