O Mito da Ressocialização
A
ressocialização de presos é tratada como um princípio do direito penal no
Brasil. Na prática é fruto mais de um conceito de “politicamente correto” do
que uma pesquisa empírica. Na maioria dos países a ressocialização não é um
objetivo do Direito Penal, o qual tem como objetivo punir, e cita-se como
exemplo os Estados Unidos. Por outro lado, a Constituição Italiana prevê que a
ressocialização é um dever do sistema prisional.
As pessoas confundem “humanização” com “ressocialização”.
Ou seja, nos Estados Unidos os presídios são bem melhores que os brasileiros,
pois visam o cumprimento da pena respeitando os direitos humanos dos presos ao
menos no aspecto de estrutura física. No entanto, são extremamente rigorosos no
cumprimento da pena com punições administrativas que não são computadas no
quantum da pena.
No Brasil não há uma norma prevendo expressamente este
objetivo de ressocialização, o qual é difundido de forma tão opressiva que
muitos chegam a acreditar que a função do Direito Penal é como a de um Mosteiro
que é formar monges após a ressocialização.
No entanto, esquecem-se que a ressocialização é como
deixar de fumar, beber, usar drogas, ou seja, depende 99% da vontade do sujeito
e apenas 1% do apoio estatal, da família ou da sociedade.
Noutro sentido é possível sustentar para a ideologia
dominante, para a qual a ressocialização é um objetivo do direito de punir do
Estado, que então todas as pessoas que cometem ato imoral ou ilícito deveriam
ser processadas e presas para serem “ressocializadas”. E mais, a pena não seria
finalizada enquanto não se tivesse certeza de que estão ressocializadas (boa
parte ficaria presa eternamente).
Em razão deste objetivo místico de ressocializar presos
fica a incógnita de como ressocializar quem cumpre pena alternativa (sem
prisão).
Para esta
visão absoluta de ressocialização são concedidos benesses aos presos como indulto (perdão
da pena), saídas temporárias (35 dias por ano), direito de visitas como se
fosse um piquenique prisional com crianças e familiares passeando pelos
presídios, enquanto outros conseguem direito de terem relações sexuais nas
celas motel, além de muitos outros, mas mesmo assim a população carcerária
continua a aumentar.
Um dos motivos para o aumento da quantidade de presos são
os pequenos delitos cometidos por usuários de drogas, mas para o grupo que
comanda a política prisional ainda acredita que ensinar artesanato para preso é
mais útil e eficaz do que implantar políticas de atendimento ao usuário de
drogas nos presídios, embora haja pesquisas nos Estados Unidos que comprovam
resultados para tratamento dependentes químicos nos presídios.
A ideologia dominante usa os meios estatais de comunicação
social do Governo para divulgarem que prisão gera mais reincidência, mas não
mostram os dados e nem a forma de apuração dos mesmos. Difícil imaginar como
fazem isto se nem há um banco de dados integrado.
Ademais, nem todo criminoso é flagrado ou tem a sua
autoria descoberta.
A rigor, infratores que cometem crimes que geram prisão
são mais perigosos, bem como habituais no crime, e criminosos que cometem
crimes que implicam em penas alternativas são criminosos menos perigosos e eventuais. Logo, é natural
que punidos com pena alternativa gerem menos reincidência. Em suma, a ideologia
dominante confunde causa com conseqüência. As pessoas não cometem mais crimes
porque são presas, mas sim são presas porque cometem crimes mais perigosos, logo
a reincidência é causa e não conseqüência, ao contrário do que sustenta a
ideologia dominante.
Na lógica atual a função do direito penal deixou de ser
punir e passou a ser ressocializar. Isto banaliza o direito penal,
descaracteriza sua autoridade moral, amplia excessivamente o leque de crimes,
transforma criminosos em falsas vítimas da sociedade e paradoxalmente aumenta o
número de presos.
De fato há mais presos pobres, mas isto decorre de dois
fatores: o primeiro é que temos em qualquer país do mundo mais pobres do que
ricos. Outro fator é que pobres tendem a cometer crimes menos elaborados como
furtos e são presos mais facilmente. Enquanto ricos cometem crimes mais
elaborados como golpes, desvios pela internet e no Brasil temos uma
investigação precária que não consegue apurar estes crimes mais complexos.
Logo, tanto ricos como pobres cometem crimes, porém é mais fácil provar furtos
do que golpes, portanto a PM prende mais em flagrante de furto (crime menos
complexos).
As pessoas cometem crime porque querem, e não por uma
imposição da sociedade, como sustenta a teoria da “defesa social”. Isto não
significa que o cumprimento da pena não deva obedecer aos princípios da
humanização. No entanto, não faz sentido que criminosos perigosos sejam
considerados vítimas com benesses enquanto a sociedade fica refém de seus
ataques.
Kant já afirmava que a função do direito penal é punir.
Mas, atualmente quem sustenta esta linha é considerado como “persona non grata”
no Brasil.
Não tem como o Estado impor a ressocialização aos presos,
pois muitos não querem. Outros não precisam de serem ressocializados porque são
criminosos eventuais como um homicida em razão de uma discussão.
A ressocialização deve ser considerada como a necessidade
de o cidadão cumprir os seus deveres e direitos. No entanto, na execução penal
é comum que presos aprendam que têm apenas direitos e nunca deveres,
principalmente pela benevolência dos Tribunais.
Não é ensinando os presos a fazerem artesanato, nem
ensinando a trabalhar na construção civil que serão ressocializados, pois
direito penal não direito de qualificação profissional. Estas atividades têm
sua finalidade nobre e romântica, mas não diminuirão a criminalidade. Afinal, o
que diminui criminalidade é punição e se o Direito Penal perde o controle
social de punição, então a reincidência aumenta.
Lado outro, com o tempo as pessoas tendem a cometer crimes
mais elaborados ou diminuem os crimes assim que diminui a dopamina (hormônio do
risco e do prazer). Portanto, com a idade é natural que o cidadão deixe de
cometer crimes e não por causa de eventual política assistencialista prisional.
Em suma, depois dos 40 anos é natural que o criminoso deixe de cometer crimes
com maiores riscos, exceto se for psicopata ou um golpista inveterado.
Simplesmente ser aprovado em ENEM (Exame educacional)
também não é ressocialização, nem sinal de que não vai cometer crime, pois se
fosse assim não existiria médicos, advogados, promotores, juízes, delegados,
fiscais, empresários e até banqueiros cometendo crime.
Sem dúvida alguns ressocializarão, porém muito mais pela
assistência religiosa ou pela vontade própria do apenado, do que pelos demais
serviços sustentados pelos adeptos da ideologia da ressocialização.
Por fim, a ressocialização é um ato de vontade do cidadão,
não pode ser imposta pelo Estado. Outrossim, não são apenas presos, que
deveriam ser ressocializados, afinal, a ressocialização não é uma função
exclusiva do direito penal, mas de qualquer ramo do Direito e até da moral.
Ademais, pode-se afirmar que a ressocialização é um conceito mais moral do que
jurídico, não se confundindo humanização com ressocialização, pois conceitos
diversos como se vê nos Estados Unidos.
Por André
Luis Alves de Melo, Promotor de Justiça em Minas Gerais.
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