Crime
de estupro e “beijo lascivo”
A Primeira Turma iniciou julgamento de “habeas
corpus” em que se pretende a desclassificação do delito previsto no art. 217-A
(1) do Código Penal (CP) — estupro de vulnerável —, para a conduta versada no
art. 65 (2) do Decreto-Lei 3.688/1941, a Lei de Contravenções Penais (LCP).
Na origem, o paciente foi condenado a oito anos
de reclusão, em regime inicial semiaberto, em razão da suposta prática de
estupro de vulnerável. A ação consistiu em ato libidinoso (beijo lascivo)
contra vítima de cinco anos de idade.
O impetrante ressaltou que a conduta do paciente
não se enquadra no tipo penal do art. 217-A do CP, mas na contravenção penal de
molestamento. Além disso, sustentou a ausência de dano psicológico à vítima,
bem como a desproporcionalidade entre os fatos ocorridos e a sanção aplicada.
O ministro Marco Aurélio (relator) deferiu a
ordem. Para ele, a inovação legislativa reuniu no conceito mais abrangente de
estupro os antigos crimes de estupro e de atentado violento ao pudor — redação
anterior dos arts. 213 e 214 (3) do CP —, estipulando pena de oito a quinze
anos para o delito de constranger menor de catorze anos à conjunção carnal ou à
prática de ato libidinoso diverso.
O relator asseverou que a conduta do réu se restringiu
à consumação de beijo lascivo. Tal proceder não se equipara àquele em que há
penetração ou contato direto com a genitália da vítima, situação em que o
constrangimento é maior, a submissão à vontade do agressor é total e a
violência deixa marcas físicas e psicológicas intensas.
Ressaltou, ademais, que o estudo social
realizado na fase de instrução processual não revelou alterações emocionais e
comportamentais incomuns à faixa etária da menor.
Concluiu que o Tribunal de origem, ao condenar o
paciente à prática de contravenção penal de molestamento, atuou em harmonia com
o Direito posto. Observado o desvalor menor da ação e presente o princípio da
proporcionalidade, o juízo optou pela repressão menos severa.
Em divergência, o ministro Alexandre de Moraes
ponderou que, para determinadas idades, a conotação sexual é uma questão de
poder, mais precisamente de abuso de poder e confiança. Entendeu presente, no
caso, a existência de conotação sexual e de abuso de confiança para a prática
de ato sexual. Para ele, não há como desclassificar a conduta do paciente para
a contravenção de molestamento — que não detém essa conotação.
Em seguida, o ministro Roberto Barroso pediu
vista dos autos.
(1) Código Penal: “Art. 217-A. Ter conjunção
carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos: Pena –
reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.”
(2) Lei de Contravenções Penais: “Art. 65.
Molestar alguém ou perturbar-lhe a tranquilidade, por acinte ou por motivo
reprovável: Pena – prisão simples, de quinze dias a dois meses, ou multa, de
duzentos mil réis a dois contos de réis.”
(3) Código Penal: “Art. 213. Constranger mulher
à conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça: Pena – reclusão, de
três a oito anos; (...) Art. 214. Constranger alguém, mediante violência ou
grave ameaça, a praticar ou permitir que com ele se pratique ato libidinoso
diverso da conjunção carnal: Pena – reclusão de dois a sete anos.” (Redação
anterior à vigência da Lei 12.015/2009.)
HC 134591/SP, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 27.6.2017. (HC-134591)
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