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domingo, 3 de setembro de 2017

Espaço do acadêmico - Amanda Vicente de Farias Batista


O homicídio de crianças indígenas: preservação e autoafirmação da cultura ou cegueira constitucional?

O homicídio de crianças na cultura indígena é uma prática que ainda ocorre hodiernamente e é comum em pelo menos 13 etnias indígenas. Não se tem noção de quantas crianças já foram vítimas dessa tradição, pois é um crime sem testemunhas praticado apenas pela parturiente, a mãe indígena que no momento do parto se isola na floresta e após a saída do bebê ela analisa se nele há alguma deficiência, se é gêmeo ou se é fruto de relação extraconjugal, se sim ela é pressionada pela tribo e influenciada pela cultura a matar a criança.

Esse crime, apesar de sempre ser confundido, não se caracteriza como infanticídio, pois falta-lhe a presença elementar do estado puerperal. A influência do estado puerperal, citado no Art. 123 do Código Penal, é caracterizado por uma perturbação psíquica que acomete mulheres durante o período do parto e logo após, fazendo com que haja a diminuição de capacidade de entendimento da mãe. Somente em caso de psicose puerperal, a qual atinge completamente a capacidade de entendimento, é que a mãe será inimputável.

Logo, não há que se falar em infanticídio nesses casos, porque na verdade as mães indígenas não estão submetidas à influência do estado puerperal sempre que uma criança com deficiência ou com as características já citadas nasce, e sim submetidas à uma tradição étnica.

A Constituição Federal Brasileira reconhece a cultura, os costumes e as tradições indígenas, e trata essa etnia com peculiaridade. Porém ela peca no sentido de não tratar desses casos alarmantes. O índio não pode ser criminalizado pela cultura mas deve ser feito um trabalho de forma que eles possam compreender o valor inestimável da vida. Nesse momento entra a cegueira constitucional, a qual é regida por uma lei protecionista porém contraditória quando se trata do direito indisponível a vida, o bem fundamental mais caro protegido pela CF.

Há um dado assustador que merece destaque, no Mapa da Violência de 2014, a cidade de Caracaraí-RR é a mais violenta do país pelo fato de que com apenas 19 mil habitantes foram registrados em um ano 42 homicídios, e desses 37 eram de recém-nascidos indígenas.

Por outro lado, existe a insustentável argumentação de que esses homicídios são praticados para que o bebê não sofra com a doença quando começar a crescer, além disso, existem dificuldades ainda maiores para eles já que irão crescer sem assistência médica adequada, por isso a “necessidade” de salvá-los do sofrimento através do assassinato, preservando assim uma tradição indígena que os reafirma. Mas essa visão também não consegue justificar o homicídio de gêmeos e de filhos de relações extraconjugais.

Na verdade, é preciso que o Estado pare de fechar os olhos e comece a enxergar esses crimes recorrentes nas aldeias, de forma que entre com ações sociais buscando interferir radicalmente nessas decisões culturais. Acima da cultura está a vida, a qual deve ser preservada contundentemente pelo Estado, responsável por fornecer assistência médica e psicológica para as famílias indígenas.

Foi apresentado um projeto de lei em 2007 que tenta impedir a prática do homicídio infantil nessas situações através de ações públicas. Porém, a FUNAI se posiciona de maneira contrária pois afirma ser necessário compreender a dinâmica da vida dos índios. Têm-se porém que se ater a questão de que não se trata de respeitar as regras internas da aldeia, mas de respeitar os Direitos Humanos, que é inerente a todo ser humano.


        

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