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domingo, 8 de março de 2015

Conselho Federal de Medicina





O artigo a seguir, publicado no boletim do Conselho Federal de Medicina, trata de decisão judicial que permite ao médico autorizado pelo paciente ou seu responsável legal limitar ou suspender tratamentos exagerados e desnecessários que prolonguem a vida do doente em fase terminal de enfermidades graves e incuráveis:

Os conselhos de Medicina alcançaram importante vitória nos campos ético e jurídico em 1º de dezembro. O juiz Roberto Luis Luchi Demo emitiu sentença onde considera improcedente o pedido do Ministério Público Federal por meio de ação civil pública de decretação de nulidade da sua Resolução nº 1.805/2006, que trata de critérios para a prática da ortotanásia.  A decisão divulgada pela 14ª Vara da Justiça Federal, sediada em Brasília, coloca ponto final em disputa que se arrastou por mais de três anos.

Em sua sentença, o magistrado afirma que, após refletir a propósito do tema, chegou “à convicção de a resolução, que regulamenta a possibilidade de o médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente na fase terminal de enfermidades graves e incuráveis, realmente não ofende o ordenamento jurídico posto”.  Essa possibilidade está prevista desde que exista autorização expressa do paciente ou de seu responsável legal.

“Estamos orgulhosos do desfecho alcançado. Trata-se de uma sentença que resgata nossa preocupação com o bem estar e o respeito ao direito de cada individuo. Prevaleceu uma posição amadurecida ao longo dos anos”, saudou o presidente do Conselho Federal de Medicina, Roberto Luiz d’Avila, ao comentar a sentença.

Para ele, a decisão valoriza a opção pela prática humanista na Medicina, em detrimento de uma visão paternalista, super-protetora, com foco voltado para a doença, numa busca obsessiva pela cura a qualquer custo, mesmo que isso signifique o prolongamento da dor e do sofrimento para o paciente e sua família.

Competência - O juiz Roberto Demo citou ainda exaustivamente manifestação inclusa no processo feita pela procuradora da República Luciana Loureiro Oliveira que havia solicitado a desistência da ação movida pelo próprio Ministério Público. De acordo com ela, apesar da polêmica que o tema encerra nos campos jurídico, religioso, social e cultural, cinco pontos agregam valor à Resolução nº 1805/2006.

Em primeiro lugar, na opinião do MPF, o CFM tem competência para editar norma deste tipo, que não versa sobre direito penal e, sim, sobre ética médica e conseqüências disciplinares. Outra premissa surge na avaliação da procuradora, acatada pela sentença final, para quem a ortotanásia não constitui crime de homicídio, interpretado o Código Penal à luz da Constituição Federal.

A sentença afirma ainda que a Resolução nº 1805/2006 não determinou modificação significativa no dia-a-dia dos médicos que lidam com pacientes terminais, não gerando, portanto, os efeitos danosos alardeados na ação proposta. Segundo a decisão, a regra, ao contrário, deve incentivar os médicos a descrever exatamente os procedimentos que adotam e os que deixam de adotar, em relação a pacientes terminais, permitindo maior transparência e possibilitando maior controle da sua atividade médica.

Cuidados paliativos 

A decisão ainda avança mais ao entender que a ortotanásia (tema central da ação civil) se insere num contexto científico da Medicina Paliativa. “Diagnosticada a terminalidade da vida, qualquer terapia extra se afigurará ineficaz. Assim, já não se pode aceitar que o médico deva fazer tudo para salvar a vida do paciente (beneficência), se esta vida não pode ser salva. 

Desse modo, sendo o quadro irreversível, é melhor - caso assim o paciente e sua família o desejem - não lançar mão de cuidados terapêuticos excessivos (pois ineficazes), que apenas terão o condão de causar agressão ao paciente. Daí é que se pode concluir que, nessa fase, o princípio da não-maleficência assume uma posição privilegiada em relação ao princípio da beneficência - visto que nenhuma medida terapêutica poderá realmente fazer bem ao paciente”, cita o documento.

Após ressaltar a dificuldade em estabelecer a terminalidade, assim como a de diagnosticar uma doença rara ou optar por um tratamento em lugar de outros, assumindo a falibidade da Medicina, a sentença afirma que a Resolução nº 1865 representa a manifestação de uma nova ética nas ciências médicas, que quebra antigos tabus e decide enfrentar outros problemas realisticamente, com foco na dignidade humana.

Por outro lado, o presidente d’Avila afirmou que o CFM e os CRMs acompanharão a tramitação no Congresso Nacional dos projetos que descriminalizam a ortotanásia no Código Penal. “A  decisão do Judiciário contempla a própria evolução dos costumes e das relações sociais. A sociedade está preparada para essa mudança que tem como fundo o resgate da dignidade do ser humano em todos os momentos de sua trajetória, inclusive na morte”, concluiu Roberto d’Avila.

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