Homicídio Privilegiado
1. Introdução
O
artigo 121, §1 º traz uma modalidade de homicídio onde o agente comete o delito
impulsionado por determinadas circunstâncias e é tipificado como “homicídio
privilegiado”. Em verdade o termo “privilegiado” foi fruto de criação
jurisprudenciale doutrinária, de fato as hipóteses arroladas no supracitado
dispositivo tratam de causas motivadoras do crime que podem diminuir a pena do
agente, alguns autores defendem que o
magistrado deve diminuir a pena, o
termo “pode” se limita ao quantumda
diminuição.É válido ressaltar que essas hipóteses legais são de caráter
subjetivo, isto é, se relacionam com o agente e não com o fato e por esses
motivos não se comunicam com os demais partícipes e coautores, segundo os
conformes do artigo 30 do Código Penal.
2.
Circunstâncias que ensejam o privilégio
As circunstâncias que ensejam o privilégio são
três: motivo de relevante valor social, motivo de relevante valor moral e
domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima.
O motivo de relevante valor social diz respeito a
um interesse da coletividade, onde o agente comete o delito em prol do “bem
maior”. Exemplo: matar um perigoso estuprador que aterroriza as mulheres e
crianças de uma pequena cidade.
Contrapondo o motivo de relevante valor social,
aquele motivo de relevante valor moral corresponde a um interesse particular
daquele responsável pela prática do homicídio, e tal motivo seria “aprovado
pela moral e considerado nobre e altruísta”. Exemplo: matar o indivíduo que
estuprou a sua filha ou esposa.
O código
penal também coloca como circunstância capa de ensejar o privilégio o “domínio
de violência emoção”. Nelson Hungria nos ensina o seguinte “emoção é um estado
de ânimo ou de consciência caracterizado por uma viva excitação do sentimento. É
uma forte e transitória perturbação da efetividade, a que estão ligadas certas variações somáticas ou modificações
particulares da vida orgânica”. Contudo, não apenas a emoção é suficiente para
configurar o privilégio. Ao fazer uma leitura na parte final do dispositivo
aqui estudado, percebe-se a presença de três elementos constitutivos do
privilégio e apenas na presença dos três é que a incidência do privilégio é
possível, são eles:
a)
domínio
de violenta emoção: a emoção deve ser intensa, capaz de modificar o
estado mental do agente a ponto de tirar-lhe a seriedade e a integridade que
normalmente ele possui. É válido ressaltar que a paixão não se confunde com
violenta emoção , visto que a paixão é algo mais duradouro e um crime praticado
sobre sua égide não estaria passível a aplicação do privilégio, além do que a
relação de imediatidade exigida pelo pelo artigo 121, § 1º, do Código Penal não
estaria presente;
b)
injusta
provocação da vítima: a provocação tem que ser injusta, que pode ser,
mas não necessariamente há de ser criminosa Nas palavras de Cleber Masson
“provocação injusta é o comportamento apto a desencadear a violenta emoção e a
consequente prática do crime. Não se exige por parte da vítima o propósito
direto e específico de provocar, sendo suficiente que o agente sinta-se
provocado injustamente.”;
c)
reação
imediata: se faz necessário que a ação do agente seja “logo
em seguida” da injusta provocação da vítima. O artigo 121, § 1º do Código Penal
estabelece uma relação de imediatidade entre a injusta provocação davítima e
ação homicida. O Código Penal não estabelece uma janela temporal fixa, contudo
um relevante lapso temporal entre a provocação e a ação é motivo para que o
privilégio não seja mais aplicável. Deve-se analisar o caso concreto para um
melhor entendimento.
É necessário dispor sobre a diferença entre esta
última modalidade de privilégio estudada e a atenuante genérica presente no
artigo 65, inciso III, alínea “c” do Código Penal, e são elas :
a)
o
privilégio é apenas aplicado ao
homicídio doloso e a atenuante genérica a qualquer delito, inclusive no
homicídio doloso, na ausência de um ou mais requisitos do privilégio;
b)
no
privilégio é necessário que o delito
seja praticado sob o domínio de violenta emoção, na atenuante apenas basta a
influência;
c)
o
privilégio tem o requisito da injusta provocação da vítima, enquanto na
atenuante genérica é suficiente o ato
injusto;
d)
no
privilégio é necessário que haja a relação de imediatidade , coisa que não
constitui atenuante genérica
O Supremo Tribunal Federaa respeito do tema se
posicionou da seguinte maneira:
A causa especial
de diminuição de pena do § 1.º do art. 121 não se confunde com a atenuante
genérica da alínea “a” do inciso III do art. 65 do Código Penal. A incidência
da causa especial de diminuição de pena do motivo de relevante valor moral
depende da prova de que o agente atuou no calor dos fatos, impulsionado pela
motivação relevante. A atenuante incide residualmente, naqueles casos em que,
comprovado o motivo de relevante valor moral, não se pode afirmar que a conduta
do agente seja fruto do instante dos acontecimentos. (HC 89.814/MS, rel. Min.
Carlos Britto, 1.ª Turma, j. 18.03.2008.).
3.
Homicídio privilegiado qualificado
Há uma discussão recorrente onde se contempla a possibilidade
de que no homicídio privilegiado possa incidir uma qualificadora, visto que o
disposto no § 1º do artigo 121, do código penal são circunstâncias subjetivas.
Visto isso, podemos afirmar que é possível a cominação entre as hipóteses que
ensejam o privilégio e as hipóteses que qualificam o crime, desde que elas
sejam de caráter objetivo, ou seja, se relacionam como fato e não com o agente.
Essas qualificadoras de caráter objetivo estão presentes nos incisos III e IV
do artigo 121 do Código Penal. Sobre
esse tema é válido ter ciência da seguinte jurisprudência da Suprema Corte:
HABEAS-CORPUS.
HOMICÍDIO PRIVILEGIADO- QUALIFICADO: POSSIBILIDADE, MESMO COM O ADVENTO DA LEI
DOS CRIMES HEDIONDOS. PENA-BASE: FIXAÇÃO A PARTIR DA MÉDIA DOS EXTREMOS
COMINADOS, OU DA SUA SEMI-SOMA, E FUNDAMENTAÇÃO; PRINCÍPIO DA INDIVIDUALIZAÇÃO
DA PENA. 1. A atual jurisprudência do Supremo Tribunal Federal admite a
possibilidade de ocorrência de homicídio privilegiado- qualificado, desde que
não haja incompatibilidade entre as circunstâncias aplicáveis. Ocorrência da
hipótese quando a paciente comete o crime sob o domínio de violenta emoção,
logo em seguida a injusta provocação da vítima, mas o pratica disparando os
tiros de surpresa, nas costas da vítima (CP, art. 121, § 2º, IV) A
circunstância subjetiva contida no homicídio privilegiado (CP, art. 121, § 1º)
convive com a circunstância qualificadora objetiva "mediante recurso que
dificulte ou torne impossível a defesa da vítima" (CP, art. 121, § 2º,
IV). Precedentes. A superveniência das Leis nºs. 8.072/90 e 8.930/94, que
tratam dos crimes hediondos, não altera a jurisprudência deste Tribunal,
observando-se que no caso do homicídio qualificado não foi definido um novo
tipo penal, mas, apenas, atribuída uma nova qualidade a um crime anteriormente
tipificado. 2. A quantidade da pena-base, fixada na primeira fase do critério
trifásico (CP, arts. 68 e 59, II), não pode ser aplicada a partir da média dos
extremos da pena cominada para, em seguida, considerar as circunstâncias
judiciais favoráveis e desfavoráveis ao réu, porque este critério não se
harmoniza com o princípio da individualização da pena, por implicar num agravamento
prévio (entre o mínimo e a média) sem qualquer fundamentação. O Juiz tem poder
discricionário para fixar a pena-base dentro dos limites legais, mas este poder
não é arbitrário porque o caput do art. 59 do Código Penal estabelece um rol de
oito circunstâncias judiciais que devem orientar a individualização da
pena-base, de sorte que quando todos os critérios são favoráveis ao réu, a pena
deve ser aplicada no mínimo cominado; entretanto, basta que um deles não seja
favorável para que a pena não mais possa ficar no patamar mínimo. Na fixação da
pena-base o Juiz deve partir do mínimo cominado, sendo dispensada a
fundamentação apenas quando a pena-base é fixada no mínimo legal; quando
superior, deve ser fundamentada à luz das circunstâncias judiciais previstas no
caput do art. 59 do Código Penal, de exame obrigatório. Precedentes. 3. Habeas-corpus
deferido em parte para anular o acórdão impugnado e, em consequência, a
sentença da Juíza Presidente do Tribunal do Júri, somente na parte em que
fixaram a pena, e determinar que outra sentença seja prolatada nesta parte,
devidamente fundamentada, mantida a decisão do Conselho de Sentença.
(STF - HC: 76196 GO,
Relator: MAURÍCIO CORRÊA, Data de Julgamento: 29/09/1998, Segunda Turma, Data
de Publicação: DJ 15-12-2000 PP-00062 EMENT VOL-02016-03 PP-00448
4. Referências
Bibliográficas
MASSON,
Cleber. Direito PenalEsquematizado: parte especial-vol. 2 / Cleber Masson. – 6ª
ed., ver. E atual -Rio de Janeiro:Forense; São Paulo: MÉTODO, 2014;
HUNGRIA,
Nélson. Comentários ao Código Penal. 2. Ed.
Rio de Janeiro:
Forense, 1953.
PRADO,
Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro / Luiz Regis Prado, Érika Mendes
de Carvalho, Gisele Mendes de Carvalho. – 13. Ed. rev. atual. eampl.- São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2014.
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